Olho de Hoor: Zero é uma edição especial de inauguração. Trata-se de uma revisão e ampliação do conteúdo que apareceu em O Olho de Hoor, Vol. I, No. 0. Quando alguém começa a estudar Aleister Crowley, ele ou ela entra em um universo a parte. Thelema e Aleister Crowley não se tratam de um campo de estudo e é muito difícil um indivíduo conseguir capturar sua essência. Como a parábola do homem cego e o elefante, as pessoas reportam apenas aquilo que conseguem perceber. O Olho de Hoor tem o objetivo de transmitir o Sistema Mágico-Iniciático de Aleister Crowley, oferecendo instrução sobre seus ensinamentos práticos e teóricos. O propósito fundamental de O Olho de Hoor é servir de guia seguro àqueles que buscam compreender os ensinamentos de Crowley.
O leitor notará que os textos de O Olho de Hoor não utilizam a letra k em palavras como mágicka ou mesmo a palavra magick em meus escritos. Em portu-guês não há o porquê disso. No Brasil a palavra magia «magick» é distinta da palavra mágica. Magia se trata da Antiga Ciência e Arte dos Magi; mágica, por outro lado, se trata da arte do ilusionismo. Ademais, não existe nenhuma referência onde Aleister Crowley tenha utilizado esse tipo de ortografia em qualquer de seus escritos.
Talvez Crowley seja um dos homens na história sobre o qual mais foram levantadas desconfianças e inverdades, bem como atribuído fatos hilários. Quando Henry Hall, um repórter do New York World Sunday Magazine o apresentou aos leitores, ele escreveu: Alguns dizem que ele é um homem de conquistas reais, outros dizem que ele é um embuste. No entanto, todos concordam que ele é extraordinário. Crowley desafiava convenções sociais, impelia as pessoas a examinarem suas crenças e o porquê delas. Ele confrontava a fé cega com o ceticismo racional. Ao mesmo tempo, ele confrontava o ceticismo com o seu Iluminismo Científico, uma abordagem sistemática da espiritualidade cujo lema é o método da ciência, o objetivo da religião. Este era o lema de sua principal publicação, o The Equinox, a Revista do Iluminismo Científico.
Crowley era extremamente instruído e ele exige o mesmo de seus leitores, por conta disso muitos de seus escritos técnicos são difíceis de serem compreendidos – mas fáceis de serem incompreendidos. Isso o torna uma figura desafiadora, tanto ao leitor quanto ao escritor que explora seu pensamento.
O Olho de Hoor é um Jornal de Pesquisas Thelêmicas que exploram a vida e o sistema de magia preconizado por Crowley, um guia de instruções gerais para os iniciantes e quem sabe um refresco aos adeptos mais avançados. Magia e Misticismo são o foco. No entanto, estes dois temas são inseparáveis na mente de Crowley e por conta disso estão disseminados em toda sua obra, o que inclui, por exemplo, poema, ficção e a maneira de ver o mundo, quer dizer, um estilo de vida. Portanto, a discussão é ampla.
Os textos de O Olho de Hoor exploram o sistema de iniciação proposto pela A∴A∴, organização mágica cujo objetivo é a promulgação da Lei de Thelema no mundo. Mas como Thelema não está desassociada da vida de Aleister Crowley, faremos uma jornada pelas Sociedades Místicas que disseminam sua obra e ideias – a O.T.O. «Ordo Templi Orientis», E.G.C. «Ecclesia Gnostica Catholica» e SETh «Sociedade de Estudos Thelêmicos» – e as práticas mágicas e místicas destas Sociedades Iniciáticas.
Na medida em que avança na leitura destes ensaios, o leitor pode sentir o impulso de aprender ou pelo menos experimentar, mesmo que por um breve momento, os rituais e práticas místicas desenvolvidas por Crowley. Para alimentar esse impulso, irei explorar algumas das principais práticas espirituais executadas pelos thelemitas. Embora estes ensaios sejam preparados para apresentar de modo geral o sistema thelêmico, é sabido que o verdadeiro conhecimento provém da prática. É a prática espiritual, o que os hindus chamam de sādhanā – meditações, exercícios e rituais – que produz estados alterados de consciência responsáveis pela reorientação no modo de pensar, ver e experimentar o mundo. Se o leitor não estiver disposto a realizar essas práticas espirituais é pouco provável que ele tenha de verdade uma experiência profunda e vívida com Thelema.
Sempre ouvimos que a Sabedoria Oculta advém da gnose, não do estudo de livros ou a memorização de informações. Uma vez que todos os estudos e práticas fazem alusão a um simbolismo místico muito além do tempo e espaço, fora dos limites da razão, é simplesmente impossível tomar o céu por assalto apenas utilizando o construto do intelecto. A gnose vem somente através do trabalho e disciplina. Até que isso aconteça o candidato continuará comendo pelas beiradas, a margem do verdadeiro conhecimento e poder. Em outras palavras, enquanto o magista não despertar sua paranormalidade, seus rituais e práticas permanecerão pífios.
Mas o que é magia? Faça essa pergunta a uma dúzia de pessoas e receberá uma dúzia de respostas diferentes. O tema magia é um daqueles tópicos controversos que acionam distintas reações emocionais nas pessoas. Durante gerações a magia tornou-se uma arte renegada e uma ciência diabólica. Magistas não são tidos com bons olhos, principalmente em terras brasileiras, tamanho a influência judaico-cristã. Entretanto, nos tempos recentes constatamos um renascer da tradição mágica. Helena Blavatsky escancarou os portais do Ocultismo moderno quando, em 1875, inaugurou a Sociedade Teosófica. Sua intenção, abertamente proclamada, era abrir os portais do oriente para o ocidente. Isso, ao que parece, abriu portais ocultos que desde então têm trazido uma maciça gama de informações de regiões fora dos círculos do tempo através de forças ou entidades muito superiores à consciência humana.
1875 também foi o ano de nascimento de Crowley que em 1904 Crowley coroou o renascer da tradição mágica ao receber de uma entidade praeter-humana um grimório contento as fórmulas da iniciação para um novo período, uma evolução na consciência humana. Talvez, mais do que qualquer outro Ocultista ocidental Crowley tenha sido a prova viva de que a magia dá certo. Com sua visão, ele inaugurou um novo capítulo no Ocultismo moderno e entregou a humanidade uma doutrina de libertação do cativeiro degenerado da condição humana. O que ele fez foi abrir definitivamente um portal para Corrente Criativa que hoje está sendo trabalhada por inúmeros magistas modernos. Nosso trabalho é, portanto, manter este portal aberto para que novos magistas possam empreender esforços valorosos neste mesmo caminho.
A magia é um processo. Nos tempos antigos não havia diferença entre magia, ciência, religião e arte. A magia moderna é considerada um refinamento da magia medieval (práticas esotéricas formuladas na Europa durante a antiguidade e a renascença). Para o magista medieval, magia incluía a arte da alquimia, astrologia e matemática, mas a ênfase mais intrigante se dava sobre o tráfego com entidades de outras regiões da existência. Os grimórios da época concerniam, em grande parte, na interação entre o magista e o mundo dos espíritos – um mundo invisível povoado por hordas de entidades espirituais: arcanjos, anjos, entidades planetárias, elementais e demônios.
A magia possui seu arranjo próprio de atribuições, processos mentais e leis científicas ou naturais. É o método de se produzir mudanças em concordância com as leis cósmicas.
Em um diálogo não muito recente discutiu-se se a magia é algum tipo de milagre ou um aspecto da psicologia. Se ela opera por meio da fé ou da razão. Concluímos que a magia é um pouco de tudo isso. Crowley provou isso ao enfatizar que seu sistema mágico é o método da ciência, o objetivo da religião. Antes dele, Éliphas Lévi afirmou que a magia combina em uma única ciência a certeza filosófica e o eterno e infalível religioso. Na magia, fé e razão não são conceitos antitéticos; ao invés disso, são ferramentas poderosas que, quando utilizadas em conjunto, complementam e enriquecem as cerimônias mágicas. Fé e razão são duas forças conectadas pela magia. É como o paradoxo qabalístico onde duas energias opostas trabalham juntas para colocar o universo em funcionamento.
A abordagem do Iluminismo Científico
Liber Exercitorum e Liber Manus et Sagitae são as duas primeiras instruções transmitidas aos Probacionistas com as técnicas preliminares de yoga e magia no sistema da A∴A∴. Crowley definiu seu sistema como Iluminismo Científico. Seu lema é: O Método da Ciência, o Objetivo da Religião. Trata-se de uma abordagem natural e científica da magia e do hermetismo em geral. No editorial do primeiro volume do The Equinox (1909), Crowley escreveu:
“Onde quer que o conhecimento eventualmente tenha sido imputado aos homens, ele sempre foi cercado de condições e restrições. Chegou a hora de falar claramente e, tanto quanto possível, na linguagem popular. Assim os Irmãos da A∴A∴ se anunciam sem milagre ou mistério. É fácil para qualquer charlatão realizar maravilhas, confundir e até mesmo enganar não só os tolos, mas todas as pessoas, no entanto, destreinados na observação acurada; nem o treinado vê instantaneamente ou é bem sucedido em detectar a fraude. Mais uma vez, o que o A∴A∴ se propõe a fazer é permitir que homens capazes ao avanço tenham uma interpretação mais elevada e madura [...] e a prova de sua capacidade encontra-se em seu sucesso, não em qualquer outro fenômeno irrelevante. O argumento dos milagres é um non sequitur. Os Irmãos da A∴A∴ se colocam contra todo charlatanismo, seja o milagreiro ou o obscurantismo; e todas aquelas pessoas que procuraram a reputação ou a riqueza por esses meios podem esperar exposição cruel, seja de sua vaidade ou sua desonestidade [...]. Os Irmãos da A∴A∴ aconselham experiências simples e descrevem-nas pelas canetas de seu delegados escolhidos, na linguagem mais simples disponível. Se você não consegue obter bons resultados, culpe a si mesmo ou o seu método, a sua vontade; se você tiver sucesso, agradeça a si mesmo ou a Eles, a sua vontade.”
O Iluminismo Científico aborda a magia e as ciências herméticas aos olhos do naturalismo, quer dizer, contra a supertição ou o sobrenatural. Dion Fortune em Sane Occultism coloca:
“O ocultismo se encontra altamente formulado e compreendido, ajustado ao que já está estabelecido na psicologia e na ciência natural. Essa corroboração mutua é o maior teste das ciências ocultas.”
Para os Candidatos recém-admitidos na Ordem, o Objetivo da Religião é Encertar a Grande Obra: que é obter um conhecimento científico da natureza e dos poderes de meu próprio Ser. O Método da Ciência é a experimentação, sustentada pela abordagem naturalista e pragmática, fortificada pela reprodutibilidade, revisão por pares, análise crítica, objetividade, rigor e clareza.
Na fantasia popular, a imagem típica do mago é a de um velho barbado estilo Gandalf, vestido em um robe azul-escuro com planetas e estrelas bordadas, carregando um cajado enquanto profere estranhos encantamentos. No entanto, essa imagem está muito distante do magista cerimonial moderno. Aleister Crowley teceu a definição clássica do termo magia como a Ciência e a Arte de causar Mudança de acordo com a Vontade. A injunção nessa definição é que cada atitude na vida, se tomada por uma consciência superior de presença e unidirecionamento das energias da mente, é considerada um ato de magia. A vida se torna uma extensão do cerimonial mágico. A vida do magista é, em verdade, o seu círculo mágico. Todas as suas ações tornam-se atos ritualisticamente sacramentados. Crowley exemplifica isso ao falar do ato mágico como a intenção de escrever uma carta. Ele comenta que para isso é necessário à manipulação do mundo externo através de ferramentas tais como os sentidos e os membros do magista, caneta e papel. Todas devidamente coordenadas pela Vontade.
No senso comum, a imagem associada à palavra magia é a execução de algum ritual cerimonial. Embora realmente a ritualística cerimonial esteja conectada a palavra magia, trata-se apenas de um processo dentro da ampla definição de Crowley. Infelizmente, por ser tão ampla ela causa inúmeros equívocos na mente dos Candidatos, principalmente os iniciantes que não conseguem vislumbrar ainda a magia da vida ou a conexão tântrica como gosto de me referir. Na tentativa de saciar essa demanda de falta de entendimento nos Candidatos, Dion Fortune (1890-1946) alterou a equação. Ela se referiu a magia como a Ciência e a Arte de Causar Mudança na Consciência de acordo com a Vontade. Essa é uma excelente definição, uma vez que toda e qualquer mudança ocorre no âmbito da consciência. Por outro lado, não é impossível para magia causar mudanças objetivas que, na grande maioria das vezes, se traduz na reprogramação do comportamento.
A definição de Dion Fortune coloca a prática cerimonial ritualística em perspectiva, pois o foco está na mudança da consciência ao invés da mudança no mundo exterior. Nesse processo, o magista toma a mesma atitude do yogī que vê energias, entidades, forças etc. dentro da psique humana e não fora dela. É um fato amplamente aceito que o Ocultismo deveria ser uma ferramenta para alterar e expandir a consciência na intenção de que cada magista possa efetivamente apreciar e estar integrado a Realidade. No entanto, é amplamente conhecido o fato de que a grande maioria dos Candidatos usa o Ocultismo como ferramenta para escapar da Realidade. O Iluminismo Científico, portanto, divulga uma abordagem natural desse processo de expansão da consciência quando ensina que a vida – que inclui o mundo físico/externo e a consciência humana – é misteriosamente mágica. Todas as visões, sensações e os mais distintos estados de mente ocorrem dentro da psique. Um entendimento científico dos fenômenos ocultos como pertencentes à psicofisiologia humana não diminui sua beleza, mistério ou qualidade. Ao contrário, a psique humana é bela, cheia de potencial oculto, conhecimento e sabedoria. Como Lon Milo DuQuette cita em seu livro sobre Qabalah, está tudo na sua cabeça, você só não faz ideia do tamanho dela.
A magia amplia os horizontes e aperfeiçoa o controle da mente. Trata-se, portanto, de uma ferramenta para exploração, classificação e manipulação da psique humana. Suas técnicas incluem banimentos, invocações e evocações, consagração de talismãs, eucaristia e inúmeros procedimentos litúrgicos em cerimônias mágicas ou dramáticas. A prática do yoga, a entoação de mantras e orações diversas, bem como a execução diária de rituais são atos mágico-ritualísticos de manipulação da consciência. São atos de magia.
Existe um debate intenso entre os Ocultistas sobre onde exatamente à magia causa Mudança, na psique ou no mundo material. Se a magia causa mudança no mundo material, posso alegar que seus resultados ou a mudança pode e deve estar sujeita a análise científica. Em outras palavras, qualquer experiência mágico-espiritual no âmbito da psique tem uma natureza essencialmente subjetiva, quer dizer, ninguém tem acesso a ela, salvo por simpatia ou imaginação, o que não será, de fato, a própria experiência. Portanto, somente quem pode mensurar a experiência é o experimentador. No entanto, qualquer mudança no mundo físico trata-se de uma ocorrência objetiva. Por exemplo, a aparição de um demônio no triângulo da arte, a visão astral de um objeto dentro do armário em outro cômodo ou a cura de uma doença através de um ritual. Todas essas alegações objetivas deveriam ser apuradas pela análise científica: se ouve uma mudança real no mundo físico, ela deve ser objetivamente mensurada. O demônio, por exemplo, deveria aparecer em uma fotografia; a pessoa que detecta um objeto no outro cômodo deveria descrevê-lo com riqueza de detalhes e essa descrição deveria ser fiel à estrutura do objeto e a pessoa curada através de um ritual deveria ser avaliada por um médico e obter as anotações de sua análise, excluindo a possibilidade de cura através de terapias ou uso de medicamentos.
O grande problema em se alegar que a magia causa mudanças no mundo físico é que a linha que separa a experiência subjetiva da objetiva é um terreno turvo. Por exemplo, estados alterados de consciência podem ser classificados como experiência subjetiva, mesmo que estes estados sejam induzidos por alterações no sistema nervoso. Por outro lado, experiências subjetivas podem induzir ou influenciar uma mudança objetiva no comportamento. Nesse caminho, é seguro dizer que atos de magia podem alterar o comportamento da personalidade através da manipulação do sistema nervoso. Trata-se de uma mudança fisiológica e comportamental objetiva resultante de um ato de magia. Quando utilizo o termo subjetivo, não quero dizer que a experiência não seja real. A visão de uma qlipha, por exemplo, pode provocar medo, suor e até diarreia. Ou seja, uma experiência subjetiva que afeta as funções do corpo e da mente. Nesse sentido, a experiência foi objetiva e ela causou mudança no corpo e no comportamento. Este tema é extenso e vamos explorá-lo melhor em outra oportunidade.
No fim, os aspectos subjetivos da experiência tais como as sensações e o significado que você lhes atribui devem ser considerados subjetivos.
Alta Magia
A arte da Alta Magia é por natureza diferente da assim chamada «magia primitiva» como a Feitiçaria, Wicca, Vodu, Bruxaria etc. A palavra «primitiva», neste contexto, não serve para insultar os aderentes dessas tradições. Aqui a palavra apenas quer dizer «outros tipos» de sistemas e nada mais. São tradições mais simples, que exigem menos, mas providas de eficiência.
A simplicidade desses «estilos» de magia levou a produção de inúmeros livros populares de feitiços e encantamentos que são, em grande medida, inúteis. O número de livros que tratam da magia cerimonial qabalística é relativamente pequeno.
Aqui, uma larga diferença reside no fato de que muitas das técnicas primitivas requerem apenas um breve encantamento e a manipulação ritual de artefatos mágicos: vela, caldeirão de metal, um vévé etc. Às vezes o encantamento é mutilado ao longo dos tempos ao ponto do significado original das palavras se perderem, fazendo com que ele não passe de palavras sem sentido. Embora nós possamos dizer a mesma coisa sobre os métodos e procedimentos da magia cerimonial, o magista verdadeiro sabe o significado exato de cada palavra e ação no ritual. É por esse motivo que no início da carreira seu Superior lhe exige tanto estudo, treino e prática.
O Sistema Individual da A∴A∴
A A∴A∴ oferece um sistema de treinamento e desenvolvimento individual. O Candidato deve ter a capacidade de caminhar sobre as próprias pernas seguindo as instruções da Ordem e os apontamentos de seu Superior.
Para dissertar acerca desse processo de caminhada solitária e da interação entre o professor e o discípulo, O Olho de Hoor publicará a partir dessa edição um ensaio chamado O Magista Thelêmico: A Iniciação em Casa ou o Caminho do Adepto Solitário. Trata-se de um ensaio com os principais temas relacionados aos Graus da A∴A∴, em teoria e prática, enriquecido pelo relato de experiências pessoais.
A Mulher Escarlate
Frater Faustus, IX° O.T.O., enriquece essa edição de O Olho de Hoor com um relato pessoal acerca da Mulher Escarlate e sua interação com sua fórmula mágica. A fórmula da Mulher Escarlate não tem «apenas» conotações sexuais – embora elas existam. Antes – assim como na cultura tântrica – a fórmula se refere a uma atitude diferente em relação ao mundo, a vida, ao dia-a-dia.
Tradicionalmente, a Mulher Escarlate é ilustrada na forma de uma prostituta que simbolicamente permite tudo e todos em si mesma. A contra-imagem da Mulher Escarlate é a mulher casta que se fecha e não permite nenhum tipo de contato íntimo com nada ao seu redor. Nos Comentários Mágicos & Filosóficos do Livro da Lei (III:55), Crowley observa que O inimigo é esse fechamento em relação as coisas. Fechar a Porta é uma prevenção quanto a Operação da Mudança, i.e. o Amor [...]. Este fechamento é hediondo, a imagem da morte. É o oposto do Ir, que é Deus. Como a imagem da Operação de Mudança, a prostituta abraça a tudo e todos sem distinção, na medida em que a mulher casta é a imagem da estagnação e separação entre todas as coisas. Nesse caminho, a mulher casta também é a imagem do ego que se recusa a ceder sua suposta realeza clamando ser o Rei da Montanha. O Rei da Montanha é o que nós chamamos de Sagrado Anjo Guardião e o ego, seu ministro no mundo, embora ele pense ser o próprio Rei. Da mesma maneira que a mulher casta se fecha para não ter relações íntimas com os outros, o ego se fecha em si mesmo para não ceder lugar ao verdadeiro Rei, o Sagrado Anjo Guardião.
A fórmula da Mulher Escarlate é a fórmula tântrica, quer dizer, aceitar o mundo como ele é, sem recusar nada, crescendo a partir da assimilação de todas as coisas. No Velho Aeon a mulher casta era exaltada, pois a castidade era tida como uma virtude. No Novo Aeon a prostituta é exaltada em virtude, pois ela é um símbolo de crescimento e mudança. É o apego ao Velho Aeon que macula sua imagem, associando sensualidade e promiscuidade a uma atitude pecaminosa. Em O Livro das Mentiras, Cápitulo 4, Crowley diz: é um conselho para aceitar todas as impressões, é a fórmula da Mulher Escarlate; mas não se deve permitir dominar-se por impressão alguma, apenas frutificar-se; como o artista que, vendo um objeto, não o reverencia, mas produz uma obra-prima a partir dele. Este processo é mostrado como um aspecto da Grande Obra.
Todas as coisas são sagradas a mim. Eu insisto para que você tome cuidado com o orgulho de espírito, do pensamento a respeito de qualquer coisa como sendo pecaminosa ou impura. Faça com que todas as coisa lhe sirvam na sua Magia [causando mudança em conformidade com sua Vontade] como armas. Portanto, a fórmula da Mulher Escarlate é a fórmula do abraço ao mundo, aceitando tudo sem distinção de impuro ou profano. Os Eremitas de Thelema não desistem ou se afastam do mundo ou vêm as coisas como mundanas ou não-espirituais. Ao contrario, cada Thelemita se encontra imerso no Céu, como uma Estrela entre as Estrelas. No AL vel Legis encontramos: Eis aí! estes são graves mistérios. Pois existem, além disso, meus amigos que são eremitas. Atualmente não pense encontrá-los na floresta ou sobre a montanha; mas em camas de púrpura, acariciados por suntuosas bestas de mulheres com grossos membros, e fogo e luz em seus olhos, e volumes de cabelos flamejantes sobre eles; lá vós devereis encontrá-los. Vós devereis vê-los no governo, em exércitos vitoriosos, em todo modo o prazer; e deverão estar neles um prazer um milhão de vezes maior do que isto. Acautelai-vos a fim de que algum não force um outro; Rei contra Rei! Amai-vos uns aos outros com corações ardentes; sobre os homens submissos, desprezai-os na feroz luxúria de vosso orgulho, no dia de vossa cólera.
No Novo Aeon não consideramos o Mundo como uma prisão ou um vale de lágrimas, mas um Templo onde o sacramento da Vida pode ser promulgado; o corpo não considerado corrupto e impuro, mas um Ornamento puro para expressão da Energia; o sexo não é considerado pecaminoso, mas um misterioso canal de poder e a imagem da natureza extasiante de todas as Experiências de Vida, Amor, Luz e Liberdade. Existência é puro prazer.
Número de páginas | 357 |
Edição | 1 (2015) |
Formato | A5 (148x210) |
Acabamento | Brochura c/ orelha |
Coloração | Preto e branco |
Tipo de papel | Couche 90g |
Idioma | Português |
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